Foi com coragem e criatividade que Irany Alves, de 62 anos, traçou um novo rumo para sua vida. Ex-operadora de retroescavadeira, ela viu o mundo virar de cabeça para baixo após um acidente. Desempregada, com três filhos para sustentar e poucas perspectivas, enfrentou o medo e a insegurança que atingem tantas mulheres na mesma situação.
“Eu ficava pensando: como vou sustentar meus filhos? O que vou fazer da vida? Essa angústia foi virando tristeza, quase caí em depressão”, lembra Irany, que encontrou no empreendedorismo, por meio da costura criativa, a oportunidade de recomeçar.
Virada com costura criativa
A virada começou com o projeto Costuração, desenvolvido pelo Instituto Mulheres em Ação pela Cidadania (IMAC), no bairro Andorinhas, em Vitória.
A iniciativa oferece formação em costura criativa para mulheres em situação de vulnerabilidade. Só em 2025, o projeto já capacitou 60 mulheres — um o importante não apenas em direção ao mercado de trabalho, mas também à reconquista da autoestima e da autonomia.
O projeto conta com o apoio da Fortes Engenharia, por meio do programa Fortificar, que doou máquinas de costura, insumos e prestou e técnico às participantes.
“A responsabilidade social sempre esteve no nosso DNA. Sabemos que pequenas ações geram grandes transformações”, afirma Ivana Có Rodrigues Netto, gerente de Inovação Social da empresa.
Para a presidente do IMAC, Bella România, o maior valor da iniciativa está na transformação pessoal.
“Mais do que capacitação profissional, o projeto oferece às mulheres a possibilidade de se sentirem capazes, independentes e donas das próprias escolhas.”
Irany é prova viva disso. Hoje, ela é empreendedora e costureira, fala com brilho nos olhos sobre o novo momento que vive. “Isso para mim foi um gatilho maravilhoso. Hoje me sinto viva de novo”, conta, emocionada.
Empreendedorismo por necessidade
Casos como o de Irany refletem uma realidade nacional. Segundo o IBGE, cerca de 7% da população brasileira está desempregada.
Já uma pesquisa do Sebrae, em parceria com a Anegepe (Associação Nacional de Estudos em Empreendedorismo), aponta que quase 75% dos novos negócios surgem por necessidade, e não por vocação. Uma resposta direta à escassez de oportunidades no mercado formal.
“Oito em cada dez empreendedores apontam a falta de oportunidades como motivo para abrir um negócio”, destaca o presidente do Sebrae Nacional, Décio Lima.
Para o especialista em carreiras Sidcley Gabriel, o setor privado tem papel decisivo nesse cenário.
“É fundamental que a iniciativa privada tenha um olhar social, voltado para a formação de pessoas mais preparadas para o mercado. Essa é a mão de obra que será utilizada no futuro”.
O impacto vai além do indivíduo. Um estudo do Centro de Apoio Educacional Ramacrisna, em Minas Gerais, revela que a cada R$ 1 investido em projetos sociais retornam R$ 3,62 para a sociedade, por meio da geração de emprego, aumento da renda e redução da vulnerabilidade.
Reciclagem como oportunidade
Na Serra, outro exemplo de superação mostra como a reciclagem pode ser aliada da inclusão social e do desenvolvimento sustentável.
Grávida de cinco meses e viúva, Fabrícia Cantilio, encontrou na Associação de Catadores Recuperlixo uma nova chance de sustentar sua família e retomar a dignidade.
“Trabalhamos aqui por amor, por sobrevivência e pela certeza de que estamos ajudando o meio ambiente”, afirma Maria do Carmo Cantilio, presidente e fundadora da associação, que desde 1998 recicla, em média, 30 toneladas por mês.
Na Grande Vitória, a Recuperlixo integra o projeto Reciclo, desenvolvido pela Vale, que oferece capacitação, melhorias na gestão, apoio estrutural e logística para o envio de materiais recicláveis.
O Brasil ainda recicla muito pouco: apenas 8,3% dos resíduos sólidos urbanos foram reciclados em 2023, segundo a Abrelpe. O dado mais emblemático: dois terços desse volume vêm do trabalho dos catadores, e não da coleta seletiva oficial.
O potencial de crescimento do setor é enorme. De acordo com a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), a reciclagem pode movimentar até R$ 1 trilhão no Brasil até 2027, se houver investimentos e fortalecimento das cooperativas e dos catadores.
Seja com linha e tecido ou com vidro, papel e plástico, histórias como as de Irany e Fabrícia revelam que é possível transformar a dificuldade em oportunidade.
Projetos sociais que unem empreendedorismo, capacitação e sustentabilidade estão mudando vidas, fortalecendo comunidades e provando que desenvolvimento econômico e impacto social podem e devem caminhar juntos.
*Texto de Caio Dias, repórter da TV Vitória/Record