Economia

Comprar energia direto do fornecedor não garante melhoria para todos consumidores

Comprar energia direto do fornecedor não garante melhoria para todos consumidores Comprar energia direto do fornecedor não garante melhoria para todos consumidores Comprar energia direto do fornecedor não garante melhoria para todos consumidores Comprar energia direto do fornecedor não garante melhoria para todos consumidores

Vista como um o para modernização do setor elétrico, a abertura do mercado livre de energia, onde consumidores podem escolher os próprios fornecedores, pode não ser garantia de melhorias para todos e de preços mais baixos. O diagnóstico está em estudo feito pelo Instituto Acende Brasil, ao qual o Estadão/Broadcast teve o com exclusividade.

Ao revisar as experiências em outros países, a conclusão é que, embora a livre escolha traga bons resultados para alguns clientes, há desafios para que haja uma abertura bem-sucedida, como a maior participação dos clientes. A avaliação vai em linha com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que defende que haja uma ampla campanha de conscientização sobre o tema

Hoje, no Brasil, apenas grandes consumidores, como as indústrias, têm o direito de escolher de quem comprar energia. Já os consumidores residenciais não têm opção e são atendidos pelas distribuidoras, com tarifas estabelecidas pela Aneel.

No Congresso, há dois textos que determinam um cronograma, mas seguem travados. O tema também avança no Executivo. Na última semana, a agência reguladora e a Câmara de Comercialização da Energia Elétrica (CCEE) encaminharam estudos sobre o tema para o Ministério de Minas e Energia (MME), que irá realizar uma consulta pública sobre as medidas para abertura do mercado. A pasta estima que a discussão deve ser concluída até o final do primeiro trimestre.

Enquanto o setor elétrico brasileiro ainda caminha, outros países saíram na frente e permitem que consumidores escolham os próprios fornecedores. Nessa lista estão Estados Unidos, Austrália, Reino Unido, Noruega, Suécia, Finlândia e Dinamarca, por exemplo. O presidente do Acende Brasil, Claudio Salles, afirma que a experiência nesses mercado acende uma “luz amarela muito forte”. “O cenário mostra que a livre escolha não é garantia de melhoria para o consumidor como um todo.”

O estudo realizado pela entidade aponta que a abertura do mercado por si só, não irá garantir mais inovação, eficiência e tarifas mais baratas. “O desenvolvimento do mercado varejista precisa ser fomentado. O mercado precisa ser acompanhado e medidas precisam ser tomadas para facilitar a comparação de preços entre os diversos comercializadores, assegurar a segurança do mercado e minimizar os custos de transação”, diz o Acende Brasil no documento.

No Reino Unido, um dos primeiros países a abrir o mercado livre, o baixo engajamento de consumidores limitou os benefícios, mas houve vantagens para aqueles que se interessaram em analisar as alternativas possíveis para compra de energia. O baixo engajamento também foi observado em países nórdicos, mesmo com mudanças regulatórias. Já a experiência na Austrália mostra que, com ajustes regulatórios, é possível que haja benefícios ao longo do tempo. Há também uma análise de que muitas vezes os consumidores acabam não optando pela opção mais barata.

A conclusão é que a liberalização tende a beneficiar os consumidores mais engajados, aqueles que tentam buscar as melhores alternativas. É nesse sentido que o instituto destaca a necessidade de medidas para despertar interesse na população em escolher um fornecedor. Por outro lado, a entidade reconhece que há uma série de fatores que dificultam a avaliação das alternativas, como a possível falta de informações sobre todas as opções disponíveis e sobre o perfil de consumo. Além, claro, da complexidade para fazer comparações diretas de preços.

Os mesmos obstáculos são vistos pela Aneel. Em nota técnica enviada ao governo, a agência coloca como uma das prioridades a realização de campanhas de esclarecimento e conscientização dos consumidores sobre a migração e a atuação no mercado livre. A recomendação mostra que será necessário explicar para as famílias do que se trata, já que a grande maioria desconhece o tema e está acostumada a receber energia em casa, sem saber sua origem, e apenas pagar a fatura mensalmente. Outro ponto estabelecido pela agência é a indicação de um produto padrão a ser divulgado na internet pelos fornecedores, para facilitar a comparação.

Mas, apesar da análise em relação aos cenários em outros países, o instituto ressalta em seu estudo que a abertura pode trazer benefícios para o País. Segundo o documento, algumas distorções e ineficiências que existem hoje no mercado elétrico brasileiro podem ser reduzidas com a abertura, como a descentralização da contratação de energia.

“Tem algumas coisas no mercado brasileiro que são distintas em relação a outros países que a abertura do mercado tende a trazer melhorias. Uma das principais é a questão de gestão de risco na contratação de energia. Hoje, a contratação das distribuidoras é engessada, centralizada pelo governo federal, que realiza leilões. Em algum grau, o consumidor acaba sendo lesado por não ter uma gestão ativa desse risco”, avalia o diretor de assuntos econômicos e regulatórios do Acende Brasil, Richard Hochstetler.

A abertura também seria uma saída para evitar o peso dos encargos crescentes nas contas de luz. Dados da Acende Brasil, elaborados com colaboração da PwC, mostram que, em 2020, a parcela nas tarifas de energia de encargos e tributos representava quase 50%. “Hoje temos subsídios cruzados, muitos decididos pelo Congresso e, por enquanto, não está tendo intromissão na comercialização livre. A medida que abre para todos os consumidores é também uma forma de fuga. Isso é um elemento muito relevante pois a fatia que mais cresceu nas tarifas nos últimos anos foi a de encargos e impostos.

Há, no entanto, alguns requisitos para uma abertura bem-sucedida, que exigem uma série de mudanças regulatórias e na estrutura de operação do setor elétrico, de acordo com o Acende Brasil. Como, por exemplo, o tratamento dos contratos de longo prazo das distribuidoras, que basearam suas contratações em um mercado de consumidores que podem escolher migrar para o ambiente livre.

Ainda, definições legislativas mais precisas sobre a comercialização varejista de energia e o fortalecimento de mecanismos de segurança de mercado. “É preciso aprender com as lições internacionais, mas perseguir os potenciais benefícios. Permanece um desafio gigante para uma abertura bem-sucedida”, avalia Claudio Salles.